Lost to Apathy

domingo, outubro 16, 2005

In Absentia

Como dar um passo em frente?
Levantar o pé e fazer o movimento de flexão balanço para a frente e aguardar que o cérebro transmita a ordem convenientemente aos olhos para visualizar o terreno onde vamos pisar?
«Bom...!»
Tendo tudo verificado resta colocar o pé uns centímetros à frente para os olhos reavaliarem distâncias e informarem o cérebro que efectivamente avançámos um pouco. Nesta altura só pensamos se terá sido apenas um pouco ou um pouco demais. É possível que seja o suficiente para sabermos que não podemos voltar atrás sob pena de vermos a restante caminhada um pouco mais longa, cada vez mais dura e tristemente inútil. Talvez seja melhor não olhar para trás, pois apenas verão miragens, imagens de um outrora que provavelmente nunca existiu, uma realidade alternativa, um império de sentidos.
O caminho espera paciente que os pés avancem centímetro após centímetro embora os calos salientes as queimaduras dilacerantes (será que deve ser considerada a angustia que destrata o estômago, que abafa o peito e embute os pulmões sem piedade?).
«Avança» - parece ser a única palavra que ecoa.
«Avança apenas. Segue. Vai. Enfim... caminha»
O público assiste sereno, uns com desdém, outros com simpatia, a maioria expectante, embora ainda outros, aguardando que caiamos, sorriem tolamente, aguardando que gritemos:
- Não posso mais - e sucumbamos à sua vontade imperiosa, quiçá inquestionável. (será que alguém poderá ficar feliz com esta queda?)
Mas custou de mais calçar algo, vestir á pressa e dar o passo. O algo simples passo.
Porém, os comandos algo simples do cérebro, constatámos, foram muito mais complexos do que uma simples flexão de pés: a dor incessante no peito, os olhos suantes (eternamente, quem sabe? Eles nunca mais serão os mesmos).
Um longo caminho espera embora a dor se mantenha cruel. Talvez o melhor seja por as asas e voar, para longe, muito longe. Tão longe que esses olhos não mais possam alcançaro imperativo pretérito.
Olhamo-nos e perguntamos se haverá esperança no céu. Longe de toques e de sentidos, de palavras, de memórias. Pairar no céu e inspirar as nuvens, soa ao melhor caminho. Ir, e ir, e ir, e ir, e ir... Só isso. O caminho já não parece tão distante, sei, no entanto que nunca chegarei a ver o fim. Inspiro fundo outra e outra vez. Mais uma vez com um pouco mais de força enquanto ainda pairo algures no céu, distante de tudo... Fujo dos ressentimentos e tento lembrar-me da coragem. Só porque hoje senti um pouco mais...