Ab Amore
a) Not FallingEsta manhã tive um sonho maravilhoso! Estava de braços abertos, fiz força para baixo e descobri que me conseguia elevar uns centímetros. Bati os braços com um pouco mais de força e daí a nada estava a pairar sobre árvores e cabinas de telefone! Era capaz de VOAR! Puxei os braços para trás e pairei sobre toda a região; as pessoas espantadas corriam por baixo de mim. Depois, subi tão depressa que o vento me fez chorar, no entanto não conseguia parar de rir, às reviravoltas no Céu...
Era lindo!
Batia os braços compassadamente ao som da musica que soava enquanto subia de olhos fechados... Subi e subi, cheguei ao espaço...
-Estarei a sonhar?-
Quando olhei para o espaço sideral, com o coração aberto e a mente livre, naturalmente o meu ego curvou a cabeça e, admirado com o esplendor do infinito, as lágrimas vieram inapelavelmente aos olhos.
-Só posso estar a sonhar!-
Olhando para o brilho das estrelas na imensa tapeçaria celeste, muitas vezes nós perguntamo-nos:
“Quem será o causador de todo este brilho?”
Olhamos para cima em busca dessa Causa Cósmica Maior, mas não vemos nenhum Senhor de barbas longas, lá em cima, condenando os seres humanos a coisa alguma, nós vemos sim, um brilho intenso: ziliões de estrelas piscando na imensidão, como se nos alertassem de que a base da vida é a Luz.
b) The River Flows FrozenAcordei outrora com algo. Noutro tempo noutro dia, um outro mundo.
Um mundo que me guiou ao tempo onírico, quando o ódio impera e dói, mói e tresanda, emana a dor que impele à morte. A esperança escasseia e a vida segue-a fielmente sem hesitações. As mentiras de ontem prevalecem e evoluem ao ponto de se tornarem verdades absolutas... meras palavras ecoam na sala vazia de espíritos enquanto eu, ainda deitado, tento desesperadamente respirar algo diferente do enxofre em que o oxigénio, outrora abundante, se transformou.
Divago até ao dia em que tudo aconteceu. Quando o céu finalmente cerrou e as pessoas sustiveram a respiração por momentos. Agora que deixei de sentir aquele cheiro que invadia o meu coração desesperado, roubando a agonia que quero só para mim. Tudo parece muito mais claro.
-Caí...E ao mesmo tempo que sonhava o tempo desaparecia, evaporava. Em vez de eu sentir eu fingia que sonhava, ao mesmo tempo que eu mentia eu percebia que não estavas, enquanto não perdia eu percebi que era nada.
Nada.
E parei o mundo.
Ponderei novamente e, respirei mais um pouco para confirmar a insignificância do meu ser, saltei novamente e vi que não podia alcançar.
( Se eu morresse, chorarias?)Então convenci-me que nada aconteceu, que não foi geral, que não foste tu nem eu, nem nada, nem ninguém, nem onde, nem quando. Apenas não foi, nunca foi, será apenas um sonho, uma memória. Ao fim tudo soa tão igual menos as palavras, essas vão soar como vazias, condenadas a mentiras cuspidas.
(Levar-me-ias para longe... para sempre?)E no fundo acaba assim, apático, patético... Talvez o sonho se possa repetir...
They love you when you’re on, all the covers, when you’re not, then they love another Ω
In Absentia
Como dar um passo em frente?
Levantar o pé e fazer o movimento de flexão balanço para a frente e aguardar que o cérebro transmita a ordem convenientemente aos olhos para visualizar o terreno onde vamos pisar?
«Bom...!»
Tendo tudo verificado resta colocar o pé uns centímetros à frente para os olhos reavaliarem distâncias e informarem o cérebro que efectivamente avançámos um pouco. Nesta altura só pensamos se terá sido apenas um pouco ou um pouco demais. É possível que seja o suficiente para sabermos que não podemos voltar atrás sob pena de vermos a restante caminhada um pouco mais longa, cada vez mais dura e tristemente inútil. Talvez seja melhor não olhar para trás, pois apenas verão miragens, imagens de um outrora que provavelmente nunca existiu, uma realidade alternativa, um império de sentidos.
O caminho espera paciente que os pés avancem centímetro após centímetro embora os calos salientes as queimaduras dilacerantes (será que deve ser considerada a angustia que destrata o estômago, que abafa o peito e embute os pulmões sem piedade?).
«Avança» - parece ser a única palavra que ecoa.
«Avança apenas. Segue. Vai. Enfim... caminha»
O público assiste sereno, uns com desdém, outros com simpatia, a maioria expectante, embora ainda outros, aguardando que caiamos, sorriem tolamente, aguardando que gritemos:
- Não posso mais - e sucumbamos à sua vontade imperiosa, quiçá inquestionável. (será que alguém poderá ficar feliz com esta queda?)
Mas custou de mais calçar algo, vestir á pressa e dar o passo. O algo simples passo.
Porém, os comandos algo simples do cérebro, constatámos, foram muito mais complexos do que uma simples flexão de pés: a dor incessante no peito, os olhos suantes (eternamente, quem sabe? Eles nunca mais serão os mesmos).
Um longo caminho espera embora a dor se mantenha cruel. Talvez o melhor seja por as asas e voar, para longe, muito longe. Tão longe que esses olhos não mais possam alcançaro imperativo pretérito.
Olhamo-nos e perguntamos se haverá esperança no céu. Longe de toques e de sentidos, de palavras, de memórias. Pairar no céu e inspirar as nuvens, soa ao melhor caminho. Ir, e ir, e ir, e ir, e ir... Só isso. O caminho já não parece tão distante, sei, no entanto que nunca chegarei a ver o fim. Inspiro fundo outra e outra vez. Mais uma vez com um pouco mais de força enquanto ainda pairo algures no céu, distante de tudo... Fujo dos ressentimentos e tento lembrar-me da coragem. Só porque hoje senti um pouco mais...
Koyaanisqatsi
TRIIMMM!!
Acordou naqueles dias a saber a nada... Nada de especial (como se acordar não fosse o suficiente)... Após um levantar preguiçoso pensou:
- Valerá a pena??Enfim... tarde de mais, os olhos já estavam despertos, habituados à luz, tendo por isso o dia oficialmente começado. Mais um dia, mais uma batalha. Á medida que se convencia a tomar o pequeno almoço reflectia na inutilidade daquele ritual, ingerir aquele veneno chamado comida, singelamente composto por coisas que preferimos não saber, e que corrompia aquele corpo frágil e débil...
Enquanto mastigava aquele plástico aromatizado olhava para a janela e via aquele tempo cinzento, praticamente chuviscava e o céu estava pintado em tons de cinza... Pode constatar o quão confortável, estranhamente apaziguador ele era...
- O dia não começou mal - pensou enquanto ouvia a banda do momento... Isto até o incontornável pensamento sobre “aquela coisa” violou aquele sentimento aconchegante proliferando a angústia a cada poro daquele corpo (imundo, efémero, caduco), olhou para o seu telemóvel e constatou a horrível verdade daqueles textos, não conseguia acreditar na verdade, no entanto eles eram a prova necessária para dar um passo atrás e seguir em frente, embora a inépcia para tal...
“Aquela coisa” havia-se transformado em algo execrável, tão triste que as palavras faltavam para exprimir o pouco de nada em que se transformara... Incessantemente vazia, laconicamente dissoluta, desvanecida... A cada segundo que passava tudo se tornava tão claro
- Não consigo acreditar na verdade!Todos aqueles momentos que passaram começaram a fazer parte daquela coisa herética e comum chamada mentira.
- Mas já chega...! - fartou-se... e quando olhou para ou pensamentos viu que eram apenas um reflexo do que havia se tornado: um pouco de vazio, um pouco de nada, por vezes com lágrimas, por vezes acordado, para sempre dormente, sem tempo e sem medo. Mais um dia, mais uma batalha... Perdida... Para a “coisa”... outrora tão cintilante, agora tão suja, conspurcada, tão feia, fétida, morta... e pensar que um dia lhe chamámos amor...