Tratado Acerca do Sentimento do Belo e do Sublime
- E quando de repente decidimos amar... –O Amor…
O amor é igual a quando entramos numa piscina, passo a passo estamos a entrar em águas mais profundas. Então a piscina é dividida em duas partes: uma para esses que não sabem nadar, assim a água vai, no máximo, até o pescoço, e a segunda parte para aqueles que podem nadar.
Aqueles que querem aprender natação têm que aprender na primeira parte, que não é para nadadores. É aí que eles têm que aprender! Uma vez a lição aprendida, então lentamente eles terão coragem e entrarão na água mais profunda. Porque, para um nadador, não importa quão profunda a água é; o nadador está sempre na superfície. A água pode ter a profundidade de cem metros, de quinhentos metros, ou de cinco quilómetros, vai dar ao mesmo para o nadador. Só faz diferença para o não – nadador. Além de um metro e setenta, tudo é morte. Mas a piscina é só uma – rasa, funda – ela é só uma; e a linha de limite só é uma linha até que aprendemos a nadar.
Podemos ver esta analogia como um reflexo da nossa insensatez; não admira portanto que ao fim ao cabo estejamos sempre a afogarmo-nos: nunca nos demos ao trabalho de aprender a nadar. Achamos, pela nossa coragem, que simplesmente basta saltar para o lado mais fundo da piscina para que sejamos iluminados, para que consigamos sobreviver, para que saibamos nadar. Porque quando nos atiramos para a parte funda da piscina e deparamo-nos com a realidade: não aprendemos, é um facto. O que acontece depois é óbvio demais para ser explicado: debatemo-nos. E mesmo sem nos apercebermos a primeira coisa que fazemos, devido ao nosso instinto, quando alguém chega perto é puxá-la para baixo de modo a que possamos sobrevir; alguém tem que sobrevir. E no meio da nossa própria incapacidade, e a da outra pessoa também, afogamos alguém, ou somos afogados.
Não se pode comparar uma pessoa que está a aprender a nadar com uma que faz ginástica sincronizada; e todos sabemos como a ginástica sincronizada é bela. Isto remete-nos àquilo que acontece quando, no auge da nossa pretensão, pensamos saber realmente nadar, quando na verdade a única coisa que aprendemos sobre isso foi nos sonhos e nas fábulas e outras histórias de encantar. Algo que poderia ser belo como a capacidade de duas pessoas se manterem numa superfície planando sobre aquilo que seria o problema de multidões, torna-se numa amostra grotesca do que existe de menos bom em nós. É uma lição invariável, mas que recusamos a aprender.
Esta auto flagelação acontece porque, secretamente, todos amamos o sofrimento. É algo cruelmente irónico ver a nossa procura por ele. Somos obcecados com ele. Basta ver na essência em que consiste uma suposta história de amor idealizada: o sofrimento é um ingrediente impreterível e é , efectivamente, o que serve para justificar um amor. Na verdade a parte mais interessante do pensamento humano sempre foi a parte que destrói, a parte que consome. Raramente nos apercebemos da audácia que nos percorre o corpo quando em cada segundo que passa sabemos que vamos errar, pensamos para nós:
- De certeza que vou cair -
E sobra-nos sempre o consolo que as quedas aconteceram porque assim o quisemos, porque, na verdade, é a afirmação absoluta do nosso livre arbítrio. Imaginem o poder de até decidir ou equacionar o sofrimento que nos vai ser infligido por nós próprios ou por outros. E todos nós sabemos que o sofrimento que causamos sempre foi a base do nosso poder como seres vivos. Isto está escrito nos livros de história e todos assistimos a isso no telejornal de ontem.
Eis porque as pessoas são tão eficientes em descobrir defeitos. Elas encontram defeitos em si mesmas - como é que elas podem evitar encontrar esses mesmos defeitos nos outros? Na verdade, elas irão encontrá-los e irão engrandecê-los, irão torná-los tão grandes quanto possível. Esse parece ser o único meio de defesa; de alguma maneira, para salvar as aparências, para se sentirem menos-mal. Tu também precisas fazer isso.
Eis porque existe tanta crítica e tanta falta de amor. Porque somos vaidosos demais para até aprender a nadar...
4 comment(s):
Eis o teu tratado sobre amar e sofrer que explicas usando um simples facto: saber nadar.
Tenho uma ideia semelhante à tua, apesar de não concordar com a tua primeira afirmação "O amor é igual a quando entramos numa piscina, passo a passo estamos a entrar em águas mais profundas" porque há amores que tu cais literalmente do alto de um penhasco, não numa piscina, mas no meio do oceano...e tens que aprender por ti próprio a nadar, ganhar forças naturais ou sobrenaturais, suportar o sofrimento e o cansaço para então conseguires atingir terra firme, onde possas sentir-te recompensado do teu esforço. Pois bem, tens razão quando dizes que "somos vaidosos demais para até aprender a nadar" e acredita que mais razão tens quando dizes que "todos nós sabemos que o sofrimento que causamos sempre foi a base do nosso poder como seres vivos" porque realmente a arma mais mortífera e a única arma que o Homem tem realmente para magoar ou matar é o sofrimento, físico ou psicológico.
Hoje, como em todos os tempos, o Homem é talhado para amar mas, ao invés de amar, congela o seu coração com medo de sofrer, fazendo sofrer quem tiver a audácia de o amar. Faz-se sofrer para não se ser amado com medo de amar e sofrer. Onde anda a coragem do Homem?
Hoje não existe o amor no seu estado puro... O amor belo e sublime, que fascina, encanta, é vida e morte ao mesmo tempo... Porque o verdadeiro amor, que preferia morrer a deixar o outro sucumbir ao reino de Hades, foi morto pelo próprio ser humano e só renasce uma em milhões de vezes no seu estado único... No seu estado de amor perfeito!
Excelente texto! Parabéns Omega!
Beijo ***********************
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Anónimo, at
domingo, março 19, 2006
geez dude, clap clap clap, daqyeles textos de ler e reler merecedores dum prémio man, está simplesmente perfeita a analogia. estás sem duvida de parabens. keep it up dude. congrats
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Anónimo, at
domingo, março 19, 2006
Amor, do grego ágape -"palavra que se refere ao amor desprovido de interesse, do tipo que se tem, ou se deve ter, por qualquer pessoa"-. Amor, lato sensu, é uma palavra forte que muita vez -e cada vez mais- é usada em vão, como sabes existem vários tipos de amor e diversas maneiras de amar, depreendo que neste caso -e interpretando o texto no seu sentido mais amplo-, a palavra "amor" se refere ao mais básico e primitivo de todos, o amor que nutrimos por alguém que não família ou amigo.
Como qualquer outro, este sentimento não está sozinho. Aquilo a que comummente chamamos de amor vê-se muita vez rodeado de medo, alegria, paixão, preocupação, ciúme, tristeza, saudade, ansiedade (entre tantos outros) e quando tudo isto acaba -e porque acaba, pois nada é eterno- resta-nos a dúvida, a raiva, a frustração e, mais vezes do que seria benéfico, o ódio. Não sendo mais que uma reacção química desencadeada no cérebro, uma reacção de euforia e sentimento de bem-estar -reacção esta que se pode obter pelo simples acto de comer um chocolate-, é-nos, a toda a humanidade, tão querida e intrigante. Amor é alvo do pensamento filosófico, psicológico, cientifico, artístico, et cetera, é visto como algo que não pode -e a meu ver nem deve- ser justificado ou de todo percebido. É algo ilógico, que contudo não deixa de ser aceite por todos (e que remédio temos nós senão o fazer?). Definir o Amor é como definirmo-nos a nós próprios, não enquanto seres humanos, mas enquanto pessoas, nós não podemos ser definidos, perderíamos toda a nossa identidade e interesse.
Em suma, o Amor não deve ser entendido, percebido ou dissecado para mais tarde ser estudado, deve ser sentido, não obstante devemos também analisar os nossos actos que tanto parecem depender, ou ser influenciados, pelo mesmo. Analisar o sentimento? Tudo bem. Percebe-lo? Jamais.
Feita a introdução avancemos para o texto propriamente dito.
"- E quando de repente decidimos amar... –" Eis o primeiro ponto de discórdia, embora perceba (ou esteja próximo disso) o sentido da frase, nós não decidimos amar, tal como não decidimos viver (podemos decidir morrer, não viver). Nós amamos, quer queiramos quer não. A analogia da piscina é interessante, estranha, mas interessante, gostei particularmente da divisão entre os que não sabem nadar e os que podem nadar (de frisar que achei também interessante o facto de teres dito "os que podem nadar" e não "os que sabem nadar"), acho que me faço entender.
"...não admira portanto que ao fim ao cabo estejamos sempre a afogarmo-nos: nunca nos demos ao trabalho de aprender a nadar." Esta é porventura a linha mestra do texto (na minha opinião). Dás aqui como que a solução para o problema, mas este problema não tem solução, se tivesse seria esta. Aprender a amar, antes de nos lançarmos ao abraço, impossível de quebrar, do sentimento. Mas chega-se rapidamente à conclusão de que não se pode aprender a fazer algo que não dominamos, é algo que não tem uma maneira certa (ou errada) de fazer.
"...torna-se numa amostra grotesca do que existe de menos bom em nós. É uma lição invariável, mas que recusamos a aprender." O que não cessa de me espantar é a tua capacidade de analisar o comportamento humano de forma tão distanciada, mas ao mesmo tempo, usando referências pessoais. E, na minha opinião, o teu raciocínio é quase sempre certo, claro que podemos deixar isto no campo da subjectividade e dizer que nada é certo e que tudo não passa de pontos de vista diferentes, mas mesmo assim acertas em muito daquilo que afirmas.
"Esta auto flagelação acontece porque, secretamente, todos amamos o sofrimento (...) pensamos para nós: - De certeza que vou cair -" Todo este parágrafo é a mais pura das verdades, não há quem o possa contradizer, e se o fizer estará certamente a enganar-se a si mesmo, não se pode preterir o sofrimento numa relação e parafraseando-te: "o sofrimento é um ingrediente impreterível e é, efectivamente, o que serve para justificar um amor". Nós tão desesperada e cegamente buscamos essa dor, para podermos dizer que "valeu a pena".
(Agora a tal ideia com que disse não concordar) "E sobra-nos sempre o consolo que as quedas aconteceram porque assim o quisemos, porque, na verdade, é a afirmação absoluta do nosso livre arbítrio." Entrarei num campo em que me vou, certamente, contradizer, mas não posso deixar de o fazer. Pessoalmente não acho que nós possamos, ou estejamos cientes, do sofrimento que advirá de uma relação. Sim disse acima que todos nós buscamos a dor para de alguma forma justificar o empenho em algo que está, à partida, perdido e até condenado a acabar. Mas não vejo como nós podemos "decidir ou equacionar o sofrimento que nos vai ser infligido...". Será que sabendo, hipoteticamente, o sofrimento de que seríamos alvo continuaríamos a apagar a dúvida que todos temos aquando dum sentimento destes e não daríamos um passo atrás? Seríamos capazes de ir em frente sabendo, de antemão, aquilo que nos espera? Todavia, concordo com a seguinte afirmação "E todos nós sabemos que o sofrimento que causamos sempre foi a base do nosso poder como seres vivos". Sem dúvida uma crítica à humanidade, e tão válida quanto verdadeira.
"Eis porque as pessoas são tão eficientes em descobrir defeitos(...)como é que elas podem evitar encontrar esses mesmos defeitos nos outros? Na verdade, elas irão encontrá-los e irão engrandecê-los, irão torná-los tão grandes quanto possível. Esse parece ser o único meio de defesa..." O nosso desígnio parece estar em encontrar defeitos nos outros, para depois os compararmos aos nossos e no final obtermos um resultado que, de alguma forma, nos dê algum tipo de alegria, ao reparar que um outro alguém é mais "falível" que nós. Isto resume-se a medo e insegurança. "Eis porque existe tanta crítica e tanta falta de amor. Porque somos vaidosos demais para até aprender a nadar..." Vaidosos demais para admitirmos que nem sempre somos o que outros desejam, vaidosos demais para ver (e admirar) o que temos. Talvez tenhamos que aprender a amar nadar.
E porque não posso ficar aqui ad eternum não me esticarei mais, sei que esta é apenas uma parte da obra completa e gostava de poder ler o resto, noutro dia talvez. É meu dever parabenizar-te pela lógica e consistência mostrada na tua ideologia, na tua maneira de ver aquilo que outros apenas vivem sem se aperceber. Abraço.
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Anónimo, at
sexta-feira, março 24, 2006
antes de mais nada....HELL DA FUCK YEAH!
adiante...
agr vamos por partes:
começaste com uma analogia entre o saber amar e o saber nadar. não poderia estar mais bem conseguida. concordo completamente que quanto a amar, "a única coisa que aprendemos sobre isso foi nos sonhos e nas fábulas e outras histórias de encantar." no entanto, devo confessar que isto, na minha opiniao, aplica-se a toda a humanidade. isto falando do amor romantico. porque na verdade, na vida real, não existe um piscina com pé para se aprender primeiro. ainda assim penso que te dirigias a certos casos de pessoas que em vez de partilhar o seu amor, proliferam-no, como se fosse o ultimo grito da moda, desvalorizando-o.
de seguida acho que dois temas sao fundamentais no teu pensamento: sofrimento e vaidade\arrogancia. concordo contigo quando dizes que amamos o sofrimento, e que ele justifica o amor (leia-se felicidade porque na minha opiniao o amor incorpora indissociavelmente sofrimento e felicidade). é verdade. quanto á vaidade\arrogancia, entraste numa critica a humanidade em tres pontos: o busca de poder causando sofrimento aos outros, exaltar os defeitos dos outros para esconder os nossos e num ponto mais subliminar pensar que o amor é algo que mereçemos, para nos reconfortar e nao algo para construir, porque todas as construçoes dao trabalho.
concluindo: a mensagem que retirei do texto, foi a de uma critica ao amor egoista ou egocentrico. foi a ideia mais imediata que me chegou, talvez por ser a que mais concordo. penso que existe um sentimento cronico das pessoas pensarem que o amor é a cama em que nos deitamos ao fim do dia, e quando nos vemos obrigados a dormir no chão, recusamo-nos (porque claramente a nossa realeza não o mereçe) e partimos em busca de uma casa nova, com um colchão novo. acho que é isso que nos falta aprender. que dormir no chão faz muito bem á nossa coluna e que ela doi porque a torcemos com colchoes diferentes.
quanto á escrita, notei um texto mais directo, um escrita mais simples, no entanto, extremamente eficaz.
um pedido:
não pares de escrever enquanto viveres
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Anónimo, at
sábado, março 25, 2006
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